Luisa Cuevas Raposo - Novas da Galiza (Publicada em Abril 2022 no jornal em papel).- No passado mês de março a jornalista especializada em género, demógrafa e professora na Faculdade de Comunicaçom da Universidade de La Habana Dixie Edith Trinquete visitou o nosso país para ministrar umha série de palestras com o título ‘Cuba: Mulheres e Revoluçom. Estas atividades desenvolvérpm-se em Vigo, Compostela e Ferrol, e fôrom organizadas pola Associaçom de Amizade Galego-Cubana Francisco Villamil, a Marcha Mundial das Mulheres e o ‘Movimiento Estatal de Solidaridad con Cuba’.
Nestes dias, Trinquete tivo tempo de atender o Novas da Galiza e expor quais som os avanços na luita contra o patriarcado na Cuba socialista
Dixie, conta-nos em que mudou a situaçom da mulher cubana após o triunfo da Revoluçom.
Gira "Bloqueo y Mujer en Cuba": periodista Dixie Edith Trinquete (cobertura en Cubainformación)
As mudanças sociais ocorridas neste arquipélago durante a segunda metade do século XX pugérom as mulheres no centro dum processo considerado polo próprio Fidel como umha “revoluçom dentro da revoluçom” Em 1959 elas estavam entre os setores mais discriminados e explorados da sociedade, confinadas à vida privada, e muitas delas angustiadas pola pobreza. Se eram negras ou mestiças, mesmo pior.
Nessa altura trabalhavam por volta das 194.000 mulheres, na maioria como mestras, enfermeiras ou operárias. Eram as pior remuneradas. 70% eram empregadas domésticas ou subempregadas. Também constituíam a maior parte das pessoas analfabetas. Nessas primeiras décadas dos anos 60 legislou-se sobre igualdade salarial e sobre anticoncepçom e acesso ao aborto, direitos que se mantenhem até o dia de hoje. A Federaçom de Mulheres Cubanas (FMC) propujo-se elevar o nível educacional das mulheres e a sua incorporaçom ao espaço público. Elas fôrom 55% das pessoas alfabetizadas nos anos 60 e 59% das pessoas que figêrom labor de alfabetizar. Mais adiante viria a continuar-se com as batalhas por alcançar o sexto e o noveno grau educativo.
Começou-se a legislar com conceitos justos, abonda para ver o Código de Família e mais a Constituiçom de 1976. As mulheres ganhárom respeito, prestígio e autoridade.
Porém, eu digo sempre que o sistema patriarcal é compatível tanto com o capitalismo, quanto com o socialismo. Achas que é assim e portanto, após o 59 e apesar dos avances, continua a existir desigualdade?
Os tempos tenhem mudado. Hoje o mundo é outro e, é claro, as luitas som outras também. A jornalista Isabel Moya feminista e académica cubana já falecida- dizia na sua derradeira entrevista que o primeiro perigo para as mulheres cubanas era, precisamente, pensarem que já estava todo feito.
Quando olhamos para as estatísticas e vemos a quantidade de mulheres no Parlamento, a quantidade de cientistas e profissionais, podemo-nos fazer umha ideia desfigurada da realidade. Agora estamos no momento mais complexo, o de enfrentar a subjetividade, a cultura, os juízos de valor e os costumes. O de desarmar os estereótipos e os mitos, e refletir em coletivo sobre assuntos que, de tam repetidos, virárom tam naturais que nom os reconhecemos como dívidas, como pontos pendentes.
Duplas jornadas de trabalho, sobrecarga das responsabilidades dos cuidados, distribuiçom dos roles por sexo; o assédio naturalizado em piropos; o sexismo nos meios de comunicaçom; a violência de género em todas as suas formas… Estamos a viver tempos de reposicionar o feminismo, de retomar a agenda de género para refletir sobre a forma em que as mil e umha coitas quotidianas impactam de maneira diferenciada a mulheres e homens; mas também a pessoas de diferente orientaçom sexual, identidade de género ou qualquer umha outra diversidade.
“Estamos a viver tempos de reposicionar o feminismo, de retomar a agenda de género para refletir sobre como as coitas quotidianas impactam de maneira diferenciada a mulheres e homens; mas também a pessoas de diferente orientaçom sexual ou identidade de género”
Nestes últimos anos e neste mesmo momento está a haver importantes mudanças legislativas e debates, como o novo Código das Famílias, violência de género, … Di-nos até que ponto se está a aprofundar em pôr em questom o sistema patriarcal.
Penso que, como diz um provérbio chinês, “o primeiro passo é o mais longo” e já o estamos a o dar. O ano 2020, apesar da pandemia, nom foi tam imóvel se olharmos para os avances legislativos e normativos em questons de género e direitos. Durante esses meses fôrom-se cozinhando propostas e medidas para desnaturalizar a desigualdade e combater o patriarcado.
Em 2020 Cuba aprovou o seu Programa Nacional para o Avanço das Mulheres (PAM), atualizaçom do Plano Nacional de Seguimento à Plataforma de Açom de Beijing e documento programático para o empoderamento feminino. O programa e esse é talvez o seu principal valor-nasce do espírito inconforme e a determinaçom de nom dar por concluída a batalha pola igualdade, apesar dos inegáveis direitos conquistados. Insere-se, ademais, no caminho renovador que deixou aberta a aprovaçom da nova constituiçom em 2019.
Palestra de Dixie Edith Trinquete, em Vigo. (miguel riaño)
A Linha Telefónica 103, nos inícios antidroga, alargou as suas funçons à atençom e derivaçom de inquedanças ou denúncias vinculadas com as violências de género e outros maus-tratos que acontecem no cenário familiar. A campanha Junt@s pola Nom Violência, iniciativa da FMC para visibilizar o compromisso político e institucional com a eliminaçom da violência6, apresentou-se como fase inicial dum esforço muito mais amplo que, com a mensagem de ‘Tolerância Zero’, acompanhará a Estratégia Integral Cubana de Prevençom e Atençom à Violência de Género e Intrafamiliar, aprovada no fim de 2021.
Outras normativas como o Código dos Processos ou Lei Processual e o Código das Famílias, agora mesmo em debate popular prévio à sua aprovaçom, também incorporam na sua formulaçom perspetivas de género explícitas.
“Em Cuba, como noutras partes do mundo, falta ainda muito por ganhar em consciência de género e feminista. Mas sim se observam mudanças. O jeito em que se comemorou este 8 de março dá boa mostra”
Neste último 8 de março tem havido convocatórias, sobre todo de gente nova, abertamente feministas e antipatriarcais É isto umha novidade?
Em Cuba, como noutras partes do mundo, falta ainda muito por ganhar em consciência de género e feminista. Mas sim se observam mudanças, movimento. O jeito em que se comemorou este 8 de março dá boa mostra, por quanto se tratou dumha jornada lilás mais de reivindicaçom do que de celebraçons. Com o impulso dumha convocatória do movimento socialista e popular Pañuelos Rojos baixo o lema ‘Al carajo el patriarcado’, pujo-se em causa a divisom sexual do jogo e do trabalho doméstico, o assédio, as violências machistas e o femicídio. Neste 2022 nom faltárom as habituais conferências, entrevistas, crónicas televisivas, postais… em que nom colhe a listagem interminável de expetativas antipatriarcais; mas neste ano vinhérom somar-se festivais autogeridos, iniciativas em províncias, encontros entre universitárias para fazer partilhas desde a sororidade, ou apresentaçons comunitárias e de rua.